Sempre que a pergunta certa é
construída podemos ir adiante. Alguém, finalmente, argumentou: não há projeto
nacional em discussão. Eu responderia que há, ele vem sendo debatido por poucos
desde que o projeto PT fracassou e o Lula virou paz e amor. Discutia-se lá o problema
da via eleitoral e havia os que queriam retornar à via revolucionária do tipo
soviético, sempre houve porque isso foi integrado em um mundo mítico tal como o
cristianismo. E havia os que queriam
construir outra via, uma terceira via, o tal mundo das “organizações não
governamentais” que acabaram virando, a maioria delas, um modelo de retorno à
primeira via, as empresas privadas do mundo gerencial capitalista, só que pelo
viés das terceirizações praticadas pelo Estado a mando do Capital. Uma via por
meio de ações diretas de pacifismo ativo anarquista, do tipo ações educativas
ao modo do cristianismo inaugural das reuniões em catacumbas sempre foi
defendida por mim, mas pouquíssimos conseguem entende-la.
Então, não temos projeto nacional
porque as vias tradicionais estão tão completamente esgotadas que não conseguem
mais se organizar em um número maior do que meia dúzia de adeptos. O que
acontece? Acontece que o território Brasil é maravilhoso e o mundo está
padecendo de falta de espaço e de necessidade de guerras poderosas para que o
Capital consiga alavancar a sua taxa de lucro. Do jeito que estava o Capital
estava reduzindo assustadoramente sua reprodução e o Capitalismo estava vivendo
um potencial de se transformar em outra coisa, que não “capitalismo”. Estávamos
começando a vislumbrar caminhos de saída do modo de produção das manufaturas,
da indústria para o consumo desatinado, via caminhos solidários, de respeito ao
bem comum. Então, agora seria a hora do "espírito do Capital" fazer
uma grande guerra no mundo para retomar a produção de seu modo de produção,
agora visando um caminho ecológico, cuja matriz passa a ser não mais a
indústria, mas agora a tecnologia virtual e bioquímica. Mas sempre com um
índice de reprodução do lucro que lhe garanta a manutenção do seu ETHOS, qual seja
o de humilhar o subalterno, o mais fraco, o que será um perdedor em um
enfrentamento. Porque o que realmente alimentou todos os modos de produção dos
seres humanos, desde o tempo das cavernas, foi aquilo que as feministas chamam
de “patriarcalismo”, e que no mundo psicanalítico foi nomeado em algum momento
como sendo “o nome do pai”, uma estrutura simbólica na qual a ideia de “lei” se
organiza a partir de uma série de acontecimentos onde o primeiro é o ato de
subordinação do mais fraco ao poder do mais forte, por meio de uma coação
alimentada pela humilhação do que não pode se impor.
E qual o lugar do mundo melhor
para uma guerra de dimensões planetárias? O mundo árabe em primeiro lugar, que
é o mais resistente em seu ethos insubmisso, depois o lugar grego porque ele é
o ponto atrator do humanismo moderno e essa referência precisa ser destruída, e...o
Brasil que é uma terra poderosa e seus habitantes são frágeis demais. Voilá!!!
A guerra no Brasil já vem desde 1989, com a derrota do Lula nas eleições de
forma manipulada. A pergunta agora é: mas isso foi construído pelos “iluminati”
ou outra ordem secreta de super poderosos humanos, ou extraterrestres
infiltrados no planeta terra? Não necessariamente, esse ponto de origem não
precisa ser identificado por nós, os comuns, os sem poder. Qualquer que seja o
lugar de produção deste fluxo, ele é um lugar inteligente, como eram os
espanhóis diante dos indígenas da América pré-colombiana, que os pensavam como
deuses. Mas não é um lugar imortal porque a imortalidade não pertence ao mundo
material que conhecemos e é apenas sobre ele que podemos agir ( o sagrado podemos pensar e orar e isso também deve ser feito). É até possível
que os agentes de toda essa construção histórica que desagua na guerra atual
sejam muito mais aproximados da imortalidade do que nós, os comuns, mas sobre
isso só poderão atuar nossas orações, as rezas que se destinam aos lugares
espirituais, fora do mundo material visível.
Então, só poderemos identificar novos entendimentos se nos colocarmos na
condição de enfrentamento a essa atual guerra, sem nos preocuparmos com a
definição precisa – epistemológica e ontológica – sobre os limites de nossos
inimigos.
A guerra continua com a manipulação do PT por
dentro dele mesmo, para que ficasse um partido de araque. Agora a guerra
expande a sua visibilidade para destruir o que resta de "desejo de ser de
esquerda" em parte da população. Essa guerra vai muito longe. Precisamos
construir uma vida normal e uma parte dela voltada para a ação dentro da
guerra. Isso porque essa guerra, como qualquer uma das guerras, pressupõe o
desmanchamento das formas de vida cotidiana regulares, ela aciona um desmonte
das agendas de todos os indivíduos. Ao
que parece, esse desmonte está a ocorrer de um modo lento – não vão jogar uma
bomba em São Paulo e destroçar toda uma cidade – mas ele já começou a se
realizar com um discretíssimo mecanismo de desabastecimento, desorganização de
formatos, supressão de possibilidades de agir, ir e vir e realizar
procedimentos.
Vamos precisar construir nossas grutas
de reuniões, catacumbas da pós-modernidade. Vamos precisar de um demorado e
duradouro processo de organização da resistência. A velocidade máxima sempre
foi, desde as cavernas da pré-história humana, o combustível dos
patriarcalismos. A resistência agora será desconstrutiva desse ethos, o
apolíneo eficiente, e recorrerá à ética do cuidado que sempre, desde tempos
imemoriais, respeitou a delicadeza e a lentidão dos pequenos, dos frágeis, dos
que perderiam sempre em uma situação de combate. Por isso, ao buscarmos a construção de nossas novas catacumbas protegidas não poderemos crer que dentro delas estará um Jesus Cristo a nos dizer todas as verdades. Pode até - e talvez devam - existir profetas e líderes em nossas novas trincheiras, mas certamente eles não serão um só ou poucos e inevitavelmente não serão homens, não os homens que se construíram das cavernas até hoje. Também não serão as mulheres que desses homens foram coadjuvantes. Serão um novo tipo de ser humano, já em formação. E serão muitos.
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