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Foto: Milene Tafra |
O título foi proposto no livro
que iremos estudar, Força de Lei do pensador Jacques Derrida, em um curso para
amigos da área do direito, cujo objetivo é experimentar uma aproximação entre
uma específica linguagem historiográfica e as questões tratadas pela linguagem
jurídica. O curso será construído por leituras de uma bibliografia e debates
entre os participantes.
Seria Má-fé, diz Derrida (D.),
afirmar que esse título articula palavras que não se relacionam, porque seria
fácil enunciar um significado lógico para esse título, embora ele viesse a ser
enganoso porque os elementos do título contém intenções e sentidos que levantam
suspeitas: em um dos caminhos da história da humanidade, no qual ocorrem os
desmontes dos mitos originais e suas variações ao longo do tempo, há a
possibilidade de justiça? D. responde: “O sofrimento da desconstrução, aquilo
de que ela sofre e de que sofrem os que ela faz sofrer, é talvez a ausência de
regra, de norma e de critério seguro para distinguir, de modo inequívoco,
direito e justiça.
Derrida seleciona as palavras
NORMA- REGRA-CRITÉRIO e diz suspeitar ser a proposta do título que SE JULGUE
AQUILO QUE PERMITE JULGAR, AQUILO QUE AUTORIZA O JULGAMENTO. E o autor ainda
brinca com a sobrevivência de algum critério em sua fala, quando indaga se a
própria intenção do título, pensado dessa maneira, não seria violenta, polêmica
e inquisitorial. E surpreende ainda mais quando, no parágrafo seguinte diz que deve (e sublinha ser isso um dever) falar ao seu público em inglês,
já que é a língua local.
A escrita desse pensador segue
uma trama mostrando que em tudo encontramos normas, até mesmo na simples
linguagem comum, na língua materna de cada região ou país. Parando nesse ponto
do texto poderíamos imaginar que D. quer oferecer ao seu público do colóquio um
ponto de apoio normativo, a língua da região, o inglês, pretendendo assim
deixar algum “chão sob os pés” dos que o assistem.
Ora, estamos aqui começando a
estudar as relações possíveis entre a Historiografia e o Direito (logo iremos
desenvolver a ideia do porquê usamos “historiografia” e não “história”) e já
percebemos que o nosso primeiro autor inicia sua reflexão retirando a
estabilidade do lugar ocupado pelas noções de NORMA – REGRA – CRITÉRIO. Lemos apenas alguns parágrafos iniciais do
livro e já sabemos que:
1 – para refletir sobre a
“desconstrução e a possibilidade de justiça” precisamos entender que
desconstrução tende a significar lógicas de desmonte de normas, que
possibilidade refere-se a algo ainda não fixado no presente ou no passado e que
justiça tende a ser um dever ser identificado como desejado. Por isso, até onde
entendemos seguindo a tradução, D. estaria falando em algo violento, no que
seria uma espécie de ethos do título
(no que ele tem de intenção).
2- começamos a pensar nesse texto
de Derrida e já entendemos que a história humana está relacionada com o
significado da palavra desconstrução,
que poderia ser até mesmo uma forma de conquista da escrita da história essa
tal desconstrução e, assim, chegamos na ideia de historiografia. E, ainda, que há um problema anunciado em relação à
estabilidade das normas, das regras. Estamos agora falando em Direito? Sim.
Gostaria de encerrar essa
primeira aula comentando que Derrida é um daqueles autores que você precisa ler
várias vezes uma única frase para conseguir dominar o modo como essa frase vai
desaguar na frase seguinte. Com esse comentário, concluo uma pequena e inicial
exposição perguntando sobre como os operadores do direito (se é que devemos ou
podemos usar essa expressão) leem e entendem a linguagem específica do mundo do
Direito. Se leem as frases rapidamente, se entendem de forma sólida um conjunto
de palavras alinhavadas em um ordenamento no parágrafo de tal modo a poderem
ler com velocidade uma sucessão de frases escritas dentro de uma lógica já
dominada e padrão. E, se esses operadores tem poder (se podem no sentido de dever escolhido, de querer, “eu quero”, “eu
devo”) para ler vagarosamente um parágrafo de Derrida, quando esse desconstrói
as normas dentro da própria frase.
Por último, registro aqui a
lembrança de um outro autor que cairia muito bem nesse assunto da velocidade da
leitura e da solidez do texto lido, Ítalo Calvino no livro Seis propostas para o próximo milênio, no qual são abordadas seis
qualidades dos acontecimentos: leveza, rapidez, exatidão, visibilidade,
multiplicidade e consistência. Ítalo morreu, em 1985, antes de escrever sobre
consistência.
Abrimos aqui a aula aos debates.
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